Arquivo para Bole-Bole

O Sol Brilha no Guamá

Posted in metamorfosesocial with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 18/02/2010 by Luã Gabriel

Numa manhã de quinta-feira, exatamente no dia 2 de fevereiro de 1984, o sol que nasce no rio Guamá surgiu diferente, sob um intenso brilho e de um calor extremo. Nascia ali na passagem Pedreirinha o Bloco Carnavalesco Bole-Bole, surgindo no embalo das tantas alegrias conquistadas pela Escola de Samba Arco-Íris para o bairro do Guamá.

No entanto, na medida em que o tempo foi passando, os títulos para o Bole-Bole foram acumulando e o encanto da Arco-Íris repentinamente acabou quando do encerramento das suas atividades carnavalescas, então, o Bole-Bole assumiu o posto de reviver as alegrias daquele povo tão sofrido do bairro mais populoso de Belém. Foi então que a partir do ano de 1995 o Bole-Bole começou a disputar o carnaval paraense como uma Escola de Samba, primeiro no grupo B e apenas em 1997 fez sua estréia no Grupo Especial.

Desde sua fundação o Bole-Bole sempre procurou trazer para a Avenida enredos empolgantes sobre a cultura popular paraense, como a Academia Paraense de Letras, Cametá, Arraial do Pavulagem, Mestre Lucindo e o Bar do Gilson. Foram estes emblemáticos enredos que contribuíram para esta tão jovial Escola ser respeitada pelas mais velhas, chegando até alguns momentos às primeiras colocações, como nos anos de 2001, 2002 e 2008, quando conquistou o 3º lugar e no ano de 2007, em que chegou próximo, com o 2º lugar.

A determinação e a empolgação do povo guamaense fez o sol do dia 17 de fevereiro de 2010 brilhar como no dia de sua fundação, intenso e calorento, pois neste dia foi anunciada a vitória do Bole-Bole, por meio ponto, no Carnaval Paraense de 2010. Título muito merecido, pois o enredo exaltado este ano foi Palhaços Trovadores: a poesia do riso na passarela do samba.

Merecido pois os palhaços trovadores, assim como o Bole-Bole, por conta talvez de sua pouca idade, muitas vezes não é reconhecido como deveria pela mídia e pelo povo paraense como um todo. O Guamá só é reconhecido como o bairro violento e pobre. Esquecem, porém, que é neste bairro em que a cultura popular está dia após dia se recriando, seja através dos blocos e das escolas de samba, seja através das quadrilhas juninas, do boi malhadinho ou de tantos outros grupos que estão ali, muitas vezes esquecidos e que merecem cada vez mais o nosso reconhecimento.

Sendo assim, parabéns à Belém, ao Guamá, ao Bole-Bole e aos Palhaços Trovadores pelo tão merecido título de primeiro lugar do Carnaval Paraense.

 

Veja algumas fotos da festa da vitória do Bole-Bole

Minha trajetória no samba

Posted in metamorfosesocial with tags , , , , , , , , , on 10/02/2010 by Luã Gabriel

Hoje resolvi falar um pouco de minha trajetória no samba, mas para isso eu preciso voltar no tempo.

Há mais de 70 anos, no humilde barraco de minha tataravó, no Jurunas, com a chegada de primo Manito do Rio de Janeiro, fundava-se o Rancho Não Posso me Amofinar, agremiação mais antiga de Belém. Manito trazia as novidades do carnaval carioca e a disposição para a fundação dessa alegria toda em Belém.

Meu avô, David Miguel, ficava ali no cantinho, observando, vendo os primos e irmãos mais velhos dançando e cantarolando os sambas daquela que mais tarde viria a brilhar em belíssimos desfiles. O tempo passou, e o “negrinho, feinho e magrinho, filho de Aurora e Miguel, como o próprio David Miguel se apresenta em versos, cresceu e começou a tentar ocupar seu espaço na Escola que havia sido fundada na casa de sua família.

Uma coisa, porém, lhe impedia de chegar lá e chamava-se timidez. Sempre quando compunha algo mostrava escondido para alguns amigos e familiares, mas com demasiada cautela.

Foram diferenças que fizeram David Miguel se afastar aos poucos da agremiação na qual vira nascer. Seu amigo de trabalho, Luis Guilherme Pereira, começou a insistir para que o mesmo fosse conhecer o Império do Samba Quem São Eles.

David Miguel foi e se apaixonou por aquela escola. Em 1978 finalmente pôde conquistar o tão sonhado lugar na Ala de Compositores do Quem São Eles, quando no disputado festival de samba-enredo do “Theatro da Paz: 100 anos de glória” conquistou o primeiro lugar. A partir daí pôde finalmente fazer parte da família grená e branco onde compôs outros sambas individualmente e coletivamente na Ala dos Compositores.

David Miguel sempre foi do samba e deixou herdeiros dentre filhos e netos. Minha mãe Regina Celi, que também é poetisa, sempre esteve nas variadas rodas de samba, especialmente na escola que abraçou como querida, o Quem São Eles. Meu tio mais velho, Reinaldo, escreve poemas e compõe músicas. Meu primo André é músico profissional e sempre está tocando percussão em variados lugares. Todos são Quem São Eles.         

De toda minha família fui o único que optei por outra comunidade. Apesar de ter sido Mestre-Sala e Porta-Estandarte no Quem São Eles no ano de 2001 e não ter nenhum problema com esta agremiação, mas foi no bairro do Guamá em que meu coração se fixou.

Em 2002, meu grande amigo João Cunha me convidou para criar o samba-enredo do seu bloco, o Chão do Guamá. Não hesitei e o resultado foi muito bom, pois na oportunidade pude fazer grandes amigos e viver momentos muito felizes. Em 2003 o grande e imortal Nazo Silva me convidou para fazer o samba do Frutos do Xequerê, escola mirim do Guamá. Fiz o samba, apresentei no festival, meu samba foi escolhido e ainda ganhei mais duas honrarias como melhor interprete e melhor compositor. A partir daí fui convidado também para fazer parte como interprete no Bloco Mexe-Mexe e na Escola de Samba ONG Tradição Guamaense.

Fui aceito e bem recebido e por conta disso não tive escolha se não amar profundamente o bairro do Guamá, tantas vezes massificado pela mídia como um bairro pobre e violento, mas esquecido como o bairro onde a cultura popular fervilha.

Hoje, no ano de 2010, após alguns anos um pouco afastado, porém não ausente, estou de volta e com força total no bairro que me acolheu tão bem. Este ano estarei na avenida com o Frutos do Xequerê, Associação Carnavalesca Bole-Bole e o Bloco Mexe-Mexe.

Este relato é para demonstrar que muitas vezes as influências do samba e da cultura popular são herdadas do berço, como foi meu caso. É por esta razão que não há como eu deixar de lado o meu sentimento pelo carnaval e pela cultura popular. No inicio de todos os anos eu esqueço meus problemas e o que tenho de pendência e só penso no carnaval, ver as agremiações desfilarem, cantar, torcer, brincar. Acredito que só a vivência é capaz de mostrar o que as palavras não são capazes de ilustrar tão bem.

É por isso que encerro citando o grande Caymmi: Quem não gosta de samba bom sujeito não é, É ruim da cabeça ou doente do pé. Eu nasci com o samba, no samba me criei. E do danado do samba eu nunca me separei.

O Desabafo de um Sambista

Posted in metamorfosesocial with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , on 09/02/2010 by Luã Gabriel

Mais um ano chegando e junto com ele a magia do Carnaval, festividade em que no Brasil iniciou nas casas-grandes, onde barões e baronesas dançavam de modo comportado e se divertiam com as mascaras Venezianas. Herança tipicamente Européia que chegava nos trópicos. Os negros, nas senzalas na tentativa de se divertirem procuravam imitar, porém, agregando os valores e danças Africanas. Dois paralelos que se mantém até os dias atuais.

Em Santa Maria de Belém do Grão-Pará, este paralelo é visivelmente apresentado nos glamorosos bailes fechados de carnaval em oposição aos desfiles das escolas de samba e blocos pelas ruas de Belém. O samba, principal melodia nesses espaços distintos, só pôde adentrar aos espaços fechados após a sua popularização na década de 50, no entanto, antes disso era imoral, onde os negros se requebravam, enroscavam e umbigavam-se. Hoje o samba é patrimônio, produto. Mesmo não sambando ou não gostando de sambar o brasileiro o vende no exterior.

Agora voltando ao assunto dos bailes fechados e abertos, noto com um certo pesar o quanto nossa cultura popular é descartada, desvalorizada, ignorada por algumas pessoas em nossa cidade, igualmente aos tempos anteriores à década de 50. Preferem o glamour, somente o Rainha das Rainhas. Puro preconceito, despeito. Mas na verdade o Samba, o carnaval e a cultura popular devem ser aplaudidos por resistirem. “Você não samba, mas tem que aplaudir”.

A verdade é que apenas vivendo e desfrutando da cultura popular é que nos apaixonamos pra valer, independente de cor, classe ou gênero. Por isso, antes de agitar, use. Viva o Carnaval e a Cultura Popular.